COP30: o que marcou a primeira semana e o que esperar da reta final

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 Saiba dos avanços, tensões e a importância da transição justa no centro das discussões em Belém

A primeira semana da COP30, realizada em Belém, trouxe à tona tanto o potencial quanto os desafios que marcam as negociações climáticas em um momento decisivo para o planeta. Entre embates diplomáticos, fortes mobilizações sociais e alguns avanços pontuais, o início da Conferência reforçou a urgência de consolidar compromissos robustos para a transição energética e a justiça climática.

Nas salas de negociação, países desenvolvidos e em desenvolvimento divergiram sobre a inclusão de itens na agenda sobre questões sensíveis como perdas e danos, financiamento climático, transição justa e adaptação. Um dos pontos que gerou preocupação foi o surgimento de falas negacionistas que tentaram relativizar os relatórios do IPCC, base científica fundamental para o Balanço Global. A postura reacendeu disputas internas e evidenciou o quanto ainda é desafiador avançar em consensos em pleno cenário de emergência climática.

Brasil articula inclusão de roadmap para abandono de fósseis na agenda da COP30

O governo brasileiro intensificou, nos últimos dias, sua atuação nos bastidores da COP30 para garantir que o “mapa do caminho” para abandonar os combustíveis fósseis seja oficialmente incorporado à agenda da conferência, que ocorre em Belém. A proposta, que inicialmente havia ficado de fora das negociações preliminares, ganhou novo fôlego após articulações diplomáticas e já conta com o apoio de outros países.

A movimentação marca uma tentativa de dar um passo concreto em direção à principal demanda climática global: acelerar a transição energética num momento em que a janela para limitar o aquecimento global a 1,5ºC está cada vez mais estreita. Para o Itamaraty e para a equipe climática do governo, oficializar esse roadmap seria um avanço simbólico e prático para o Brasil — país que pretende protagonizar o debate climático nos próximos anos e sediará a conferência mais importante desde o Acordo de Paris.

Em negociações internacionais, o termo “mapa do caminho” — ou roadmap — refere-se a um plano detalhado que estabelece etapas, prazos e metas mensuráveis rumo a um objetivo comum. Mais do que um compromisso político, é um documento técnico que define claramente “quem faz o quê, até quando e com quais recursos”. Países e instituições costumam recorrer a esse instrumento para transformar promessas em ações rastreáveis, evitando que acordos climáticos fiquem restritos ao campo discursivo.

Ao citar o roadmap três vezes em seu discurso de abertura da COP30, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva sinalizou que o Brasil considera esse documento peça fundamental para dar concretude ao processo de transição energética. O gesto foi interpretado como um recado direto aos países participantes de que o governo espera que Belém deixe algum legado normativo significativo.

A proposta brasileira dialoga com um ponto sensível herdado da COP28, realizada em Dubai em 2023. Na ocasião, após intensas negociações, os países concordaram que era necessário “fazer uma transição para longe dos combustíveis fósseis” (transitioning away from fossil fuels). O termo, celebrado como inédito e histórico, marcou a primeira vez que um documento oficial de uma COP mencionava diretamente os combustíveis fósseis — responsáveis por mais de 75% das emissões globais de gases de efeito estufa.

Apesar do avanço, o acordo deixou uma lacuna considerada estratégica: não definiu como essa transição deveria ocorrer nem estabeleceu um prazo claro. Na prática, a ausência de um roteiro deixou o compromisso vulnerável a interpretações flexíveis e facilitou que países altamente dependentes de petróleo, gás e carvão adiassem debates mais específicos sobre metas.

É justamente essa brecha que o Brasil tenta preencher na COP30. O governo aposta que, com um roadmap oficial, será possível transformar o consenso genérico de Dubai em um processo estruturado, capaz de orientar investimentos, políticas públicas e compromissos multilaterais.

Incluir um tema sensível como o abandono dos fósseis na agenda formal da conferência, porém, não é simples. Além da resistência histórica de grandes produtores de petróleo, há divergências entre países desenvolvidos e em desenvolvimento sobre responsabilidades, financiamento e prazos. Ainda assim, segundo diplomatas envolvidos na negociação, o Brasil vem encontrando eco entre nações que defendem maior ambição climática — especialmente da União Europeia e de países mais vulneráveis aos impactos da crise climática.

O que esperar dos próximos dias

Com a conferência ainda em curso, negociadores brasileiros seguem trabalhando para consolidar o apoio necessário e incluir o roadmap nas discussões formais. Caso o esforço seja bem-sucedido, Belém poderá marcar um ponto de virada no debate global sobre combustíveis fósseis — transformando promessas em um plano de ação monitorável, com responsabilidades distribuídas e prazos mais claros.

Até lá, a principal disputa se dará justamente entre ambição e pragmatismo: quanto os países estarão dispostos a avançar e quais compromissos estarão prontos para assumir diante da urgência climática?

Manifestações e articulações 

Fora das mesas de negociação, a mobilização social foi intensa e plural. Manifestações de povos indígenas, marchas da juventude, atos simbólicos, intervenções artísticas e campanhas digitais reforçaram uma mensagem inequívoca: não haverá transição energética sem justiça social. Para organizações como a Revolusolar, esse ponto é fundamental, a transição precisa ser inclusiva, descentralizada, comunitária e orientada à redução das desigualdades. Soluções como a energia solar comunitária mostram que mitigação, adaptação e desenvolvimento local podem caminhar juntos.

Mesmo com divergências internas, a COP30 entrou para a história. Com 56 mil delegados de 194 países, tornou-se a segunda maior conferência climática já realizada pela ONU, ampliando a participação da sociedade civil e trazendo a Amazônia para o centro das discussões globais. Porém, para especialistas como Natalie Unterstell, o desempenho da primeira semana foi “produtivo” apenas no aspecto burocrático, ainda distante da urgência exigida pela crise climática. Não houve ainda aterrissagens políticas significativas.

Balanço da primeira semana e expectativas para os próximos dias

A expectativa agora se volta para a segunda semana, quando começa a fase ministerial, que é um momento em que decisões políticas precisam ser firmadas. Entre os temas mais críticos estão: a definição de um caminho para fechar o rombo financeiro da adaptação; o avanço na negociação sobre transição justa; e compromissos claros com financiamento climático. Também cresce a pressão para que a transição energética justa apareça de forma estruturada no texto final, com diretrizes de acesso democrático à energia, transferência tecnológica e apoio às capacidades de cada país.

Para a Revolusolar, o balanço da primeira semana reforça um ponto essencial: nunca foi tão difícil cumprir o Acordo de Paris, mas também nunca foi tão evidente a força da sociedade civil, das comunidades e das soluções que surgem de baixo para cima. A transição energética justa só será possível com participação direta das populações mais impactadas, distribuição de benefícios e políticas que garantam que ninguém fique para trás.

Esta semana será determinante para saber se esse caminho será incorporado nos acordos internacionais ou se seguirá avançando principalmente por iniciativas comunitárias, como as que já transformam favelas no Rio de Janeiro em referência global em energia solar compartilhada.